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Na cromatografia e em diversas técnicas analíticas, a correta definição dos parâmetros quantitativos é essencial para garantir a exatidão dos resultados. Dois conceitos fundamentais que geram dúvidas são massa e concentração, especialmente na construção da curva de calibração. Definir corretamente essas grandezas impacta diretamente na confiabilidade da quantificação de uma substância.
Neste artigo, vamos esclarecer a diferença entre massa e concentração, como esses parâmetros influenciam a calibração de um método analítico e qual a melhor abordagem para definir a curva de calibração em diferentes cenários. Além disso, apresentaremos um exemplo prático de construção de uma curva de calibração e discutiremos a importância de ajustar a concentração esperada do analito para garantir que os resultados sejam válidos dentro da curva.
Massa vs. Concentração: Entendendo os Conceitos
Massa
A massa representa a quantidade absoluta de um composto presente em uma amostra. Geralmente expressa em microgramas (µg), miligramas (mg) ou gramas (g), a massa é um fator fundamental na preparação de padrões analíticos.
Por exemplo, se pesamos 10 mg de um padrão analítico puro e o dissolvemos em 10 mL de solvente, temos uma solução com 1 mg/mL de massa absoluta do composto.
Concentração
A concentração expressa a quantidade de um composto por unidade de volume e pode ser representada em diversas formas, como:
• mg/mL (miligramas por mililitro)
• µg/mL (microgramas por mililitro)
• mol/L (molaridade) (mols por litro)
• ppb, ppm (partes por bilhão, partes por milhão)
No exemplo anterior, dissolvemos 10 mg de substância em 10 mL, então a concentração é 1 mg/mL. Se diluirmos essa solução para 100 mL, a nova concentração será 0,1 mg/mL (ou 100 µg/mL).
A grande diferença entre massa e concentração está no fato de que a massa é absoluta, enquanto a concentração depende do volume final da solução.
Curva de Calibração: Como Escolher a Melhor Abordagem?
A curva de calibração é um dos elementos mais críticos em um método analítico, pois permite correlacionar a resposta do detector (exemplo: área do pico cromatográfico) com a quantidade do analito presente na amostra. Há duas formas principais de expressá-la:
Curva baseada na massa do analito (µg, mg)
Curva baseada na concentração (µg/mL, mg/mL)
A escolha depende do método analítico e do sistema de amostragem. Vamos analisar os dois casos:
Quando Usar a Curva Baseada na Massa
Se a quantidade de amostra injetada no sistema analítico for constante (exemplo: injeção direta no cromatógrafo ou pesagem direta de amostra), a curva de calibração pode ser expressa em massa absoluta do analito.
✅ Aplicações comuns:
Métodos onde a mesma quantidade de amostra é sempre injetada (ex.: injeção de 10 µL fixa no HPLC).
Quando Usar a Curva Baseada na Concentração
Se o método analítico envolve diluições ou variação no volume de amostra injetada, a curva de calibração deve ser expressa em concentração.
✅ Aplicações comuns:
Métodos que utilizam extração em fase sólida (SPE) ou preparação de amostras com diluições. Análises onde diferentes volumes de amostra podem ser injetados, como na espectrofotometria ou ICP-MS.
Como Construir uma Curva de Calibração
Agora que entendemos a teoria, vamos aplicar na prática. Suponha que precisamos quantificar um fármaco por cromatografia líquida de alta eficiência (HPLC) e queremos construir uma curva de calibração.
Passo 1: Preparação dos Padrões
Pesamos 10 mg do fármaco padrão e diluímos em 10 mL de solvente, obtendo uma solução-mãe de 1 mg/mL.
A partir dessa solução, preparamos diluições seriadas para obter os seguintes padrões:
P1: 1,0 µg/mL
P2: 2,5 µg/mL
P3: 5,0 µg/mL
P4: 10,0 µg/mL
P5: 25,0 µg/mL
Passo 2: Injeção dos Padrões no Cromatógrafo
Cada solução padrão é injetada no HPLC, e registramos a área do pico correspondente.
P1: 12,5 área
P2: 31,2 área
P3: 60,4 área
P4: 121,0 área
P5: 305,0 área
Passo 3: Construção da Curva de Calibração
A seguir, plotamos os valores de área do pico (eixo Y) vs. concentração (eixo X) e ajustamos uma equação linear na forma:
y = ax + b
Onde:
• y é a área do pico,
• x é a concentração,
• a é o coeficiente angular (inclinação da reta),
• b é a interseção com o eixo Y.
Se o ajuste da curva for adequado (R² próximo de 1), podemos utilizá-la para determinar a concentração de analitos desconhecidos a partir da área dos picos obtidos.
Passo 4: Aplicação na Quantificação de Amostras
Agora, ao analisar uma amostra desconhecida, medimos a área do pico e utilizamos a equação da curva para calcular a concentração do analito.
Exemplo: Se uma amostra apresenta área do pico de 90,0, substituímos na equação da curva e encontramos a concentração correspondente.
Como Ajustar a Concentração da Amostra para que os Resultados Sejam Válidos?
Após construir a curva de calibração, é essencial garantir que a concentração da amostra analisada esteja dentro da faixa da curva. Se a concentração da amostra estiver fora do intervalo de calibração, os resultados podem ser inválidos.
O que Fazer se a Concentração da Amostra for Muito Alta?
Se a resposta da amostra ultrapassar o limite da curva de calibração (exemplo: uma área de pico muito maior que o valor mais alto da curva), é necessário diluir a amostra.
Exemplo prático:
Se uma amostra apresenta uma área do pico correspondente a uma concentração estimada de 50 µg/mL, mas nossa curva foi construída até 25 µg/mL, devemos fazer uma diluição antes da nova injeção.
Se diluirmos 1 mL da amostra para 2 mL (diluição 1:2), a nova concentração será 25 µg/mL, permitindo uma quantificação dentro da curva. O valor final da concentração é então corrigido multiplicando pelo fator de diluição.
O que Fazer se a Concentração da Amostra for Muito Baixa?
Se a concentração da amostra for inferior ao menor padrão calibrado, significa que o método pode não ter sensibilidade suficiente para quantificação confiável.
Soluções possíveis:
• Aumentar o volume injetado no sistema analítico (se permitido pelo método).
• Concentrar a amostra antes da análise (exemplo: evaporando o solvente e redissolvendo em menor volume).
• Ajustar a curva de calibração para incluir concentrações mais baixas.
Conclusão
A definição correta entre massa e concentração na calibração de um método analítico é fundamental para garantir a precisão dos resultados. Além disso, garantir que a concentração da amostra esteja dentro da faixa da curva de calibração é essencial para obter valores confiáveis.
Principais recomendações:
✔️ Sempre prepare padrões dentro da faixa esperada das amostras.
✔️ Se a concentração da amostra estiver acima do maior padrão, dilua.
✔️ Se a concentração da amostra estiver abaixo do menor padrão, concentre a amostra ou ajuste a curva.
✔️ Antes de iniciar um método analítico, faça um estudo preliminar para verificar a concentração esperada do analito e garantir que a calibração seja adequada.
✔️ Estratégias como criar uma curva baixa e uma curva alta partindo do último ponto da curva baixa, pode ser válida em alguns casos.
Agora quero saber de você: Como você ajusta suas amostras para garantir resultados válidos dentro da curva de calibração? Comente abaixo e vamos conversar!
Referências Bibliográficas
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Miller, J. N., & Miller, J. C. (2010). Statistics and Chemometrics for Analytical Chemistry. 6ª edição. Pearson.
Edwin Bueno é engenheiro químico com mais de 13 anos de experiência em laboratórios analíticos e ênfase em técnicas cromatograficas, atuando em centenas de projetos de alta complexidade voltados ao controle de qualidade, desenvolvimento de métodos e conformidade regulatória. É fundador e diretor técnico do laboratório analítico Atual Labs, reconhecido por sua atuação ágil nos setores de nutrição e saúde animal.
Além de sua atuação técnica, Edwin é consultor de laboratórios e indústrias, contribuindo na resolução de problemas analíticos, otimização de processos, estruturação de equipes técnicas, expansão laboratorial e gestão, implementação de boas práticas que asseguram qualidade, agilidade e robustez nos resultados.





