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No desenvolvimento de métodos em Cromatografia Líquida de Alta Eficiência (HPLC), uma das primeiras decisões estratégicas que o analista precisa tomar é: modo isocrático ou modo gradiente? Essa escolha afeta não apenas a eficiência da separação, mas também a robustez do método, o tempo de análise, o consumo de solventes e até mesmo na validação regulatória.
Neste artigo, vamos discutir os fundamentos técnicos de cada modo de eluição, compará-los e indicar quando aplicar cada abordagem.
1. Fundamentos do Modo Isocrático
No modo isocrático, a composição da fase móvel permanece constante durante toda a análise. Se a separação se inicia com 60% de água e 40% de acetonitrila, por exemplo, essa proporção não muda.
Características:
Simples de configurar e reproduzir
Ideal para amostras com analitos de polaridade similar
Menor tempo de reequilíbrio entre corridas
Curvas de calibração mais lineares
Limitações:
Pode ser ineficiente para misturas complexas com compostos muito apolares ou muito polares
Pico largo ou retido excessivamente para analitos tardios
Menor flexibilidade de retenção seletiva.
2. Fundamentos do Modo Gradiente
No modo gradiente, a composição da fase móvel varia ao longo da corrida. Por exemplo, pode-se iniciar com 90% de água e aumentar progressivamente o teor de acetonitrila até 100%.
Características:
Aumenta significativamente a resolução para misturas complexas
Melhora o perfil de picos tardios
Reduz o tempo de análise quando bem ajustado
Mais sensível a pequenas variações de volume morto e tempo
Tipos de Gradiente:
Gradiente linear
Gradiente escalonado
Gradiente concavo/convexo (curvas programadas).
3. Quando Usar o Modo Isocrático?
Métodos de rotina com amostras bem caracterizadas
Análises de compostos com faixa estreita de polaridade
Métodos que serão aplicados em grande escala e precisam de alta reprodutibilidade
Quando a separação completa é atingida em menos de 10 minutos
Situações com equipamentos mais simples ou sem controle preciso de gradiente.
4. Quando Usar o Modo Gradiente?
Amostras com grande variação de polaridade
Misturas complexas, como extratos naturais, tecidos, medicamentos multicomponentes ou resíduos em matriz
Quando é necessário eluir compostos muito retidos em tempo razoável
Em desenvolvimento de métodos para validação regulatória com maior seletividade
Quando a sensibilidade em LC-MS depende de reduzir o tempo de retenção.
6. Estratégias para Desenvolvimento de Métodos
A definição entre modo isocrático ou gradiente deve ser tomada com base em dados experimentais iniciais. Sempre que possível, recomenda-se iniciar o desenvolvimento utilizando o modo isocrático, por sua simplicidade operacional, facilidade de validação e controle mais direto das variáveis envolvidas.
6.1 Início com Modo Isocrático: Avaliação Simplificada
O desenvolvimento deve começar testando composições fixas de fase móvel com diferentes proporções entre os solventes orgânicos e aquosos, permitindo:
Observar o comportamento individual dos analitos em termos de retenção e simetria de pico
Avaliar se há distribuição homogênea dos picos ao longo do tempo de corrida
Determinar se a separação desejada pode ser alcançada sem necessidade de programação de gradiente
Vantagens:
Redução da complexidade do método
Curvas de calibração mais lineares
Reequilíbrio mínimo entre injeções
Maior robustez para aplicações de rotina e controle de qualidade.
6.2 Conversão para Gradiente: Quando e Como Fazer
Se os testes com o modo isocrático indicarem:
Picos com retenção excessiva ou tempo de análise muito longo
Picos sobrepostos no início ou fim da corrida
Matriz complexa com compostos muito polares e muito apolares
Então o uso do modo gradiente se torna necessário. Como aplicar:
Use os dados de retenção do isocrático como ponto de partida para modelar um gradiente linear.
Ajuste o tempo de eluição desejado com base nos extremos de retenção observados.
6.3 Otimização da Inclinação do Gradiente
Se a opção pelo modo gradiente se mantiver, ajuste a inclinação para:
Aumentar a seletividade entre compostos de retenção próxima
Reduzir o tempo total de análise
Evitar compressão de picos (co-eluição).
6.4 Ajuste Fino do Gradiente e Robustez
Ao definir o gradiente, é importante considerar:
Inclinação do gradiente: mais suave para aumentar seletividade, mais inclinado para reduzir tempo.
Volume e tempo de reequilíbrio: normalmente de 8–12 volumes de coluna, ajustado conforme a fase estacionária e perfil de retenção.
Lavagem pós-gradiente: essencial para eluir compostos fortemente retidos e evitar carryover em métodos sensíveis.
Além disso, validar a estabilidade da linha de base durante o reequilíbrio é essencial para métodos com detecção UV em baixos comprimentos de onda.
6.5 Escolha da Coluna e Estabilidade do Sistema
A escolha da fase estacionária deve considerar o tipo de eluição:
Colunas tradicionais (C18, C8) são eficientes para isocrático com compostos moderadamente polares
Colunas core-shell ou híbridas são ideais para gradientes rápidos e matrizes complexas
Avalie a estabilidade química da coluna com relação à variação de pH e à intensidade do solvente orgânico durante o gradiente.
6.6 Considerações para LC-MS
Para análises com espectrometria de massas:
Prefira tampões voláteis (ácido fórmico, formiato de amônio) e evite fosfatos
Use gradientes curtos e eficientes, ajustados para maximizar a ionização na fonte
Programe uma fase final de "flush" com alto teor orgânico para remover compostos aderentes.
Conclusão
A escolha entre modo isocrático e modo gradiente deve ser feita com base na complexidade da amostra, requisitos regulatórios, robustez desejada e tempo disponível para análise. Entender os fundamentos de cada abordagem é essencial para construir métodos eficientes, reprodutíveis e validados com confiança.
Analistas que dominam esses conceitos conseguem desenvolver métodos mais racionais, com menor tempo de ajuste e maior aplicabilidade industrial.
Referências Bibliográficas
Snyder, L. R., Kirkland, J. J., & Dolan, J. W. (2011). Introduction to Modern Liquid Chromatography. Wiley.
Neue, U. D. (1997). HPLC Columns: Theory, Technology, and Practice. Wiley-VCH.
Swartz, M. E., & Krull, I. S. (2012). Handbook of Analytical Validation. CRC Press.
ICH Q2(R1) – Validation of Analytical Procedures.
Edwin Bueno é engenheiro químico com mais de 13 anos de experiência em laboratórios analíticos e ênfase em técnicas cromatograficas, atuando em centenas de projetos de alta complexidade voltados ao controle de qualidade, desenvolvimento de métodos e conformidade regulatória. É fundador e diretor técnico do laboratório analítico Atual Labs, reconhecido por sua atuação ágil nos setores de nutrição e saúde animal.
Além de sua atuação técnica, Edwin é consultor de laboratórios e indústrias, contribuindo na resolução de problemas analíticos, otimização de processos, estruturação de equipes técnicas, expansão laboratorial e gestão, implementação de boas práticas que asseguram qualidade, agilidade e robustez nos resultados.





